quarta-feira, 20 de maio de 2015

brinquedo

O que o encantava era a maneira delicada com que ela ajeitava os bichos de pelúcia nas prateleiras da loja de brinquedos. Ela os enfileirava e lhes dava tapinhas para deixá-los mais fofos. Dia após dia, durante meses, ele se sentou à mesa do boteco em frente à loja só para vê-la em seu trabalho de vendedora de brinquedos.

Um dia atravessou a rua:

— Moça, aquele coração de pelúcia, por favor.

— O rosa, senhor? Embrulho para presente?

Às 19h00, do dia 20 de maio de 2006, Samara fechou a porta da loja. Não tinha pressa, dali até o ponto de ônibus, costumava caminhar por 10 minutos, o ônibus passaria em 20 minutos. Não tinha pressa. Quando chegasse em casa contaria uma história bem bacana para sua menininha e a colocaria para dormir. A noite estava bonita, mas naquele dia, em especial, também estava estranha e mais escura. Apertou o passo. Olhou para trás e decidiu correr. E correu muito antes de desistir.

Ele gostou de vê-la correr com seus saltinhos batendo no asfalto vazio.

Sorriu. Ela era delicada e miúda como os brinquedos que costumava vender.

Samara não voltou para casa naquela noite. Samara não voltou para casa nos dias e anos seguintes.

A loja de brinquedos precisou contratar outra vendedora.

E, depois dela, outras.


mariza lourenço

[imagem de Daiyou-Uonome]

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